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Loucuras da Sabedoria Humana

Parte VII

 

Tem Deus um Corpo?

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A Revista Adventista de Julho de 2004 publicou um artigo do Dr. José Carlos Ramos em forma de entrevista no qual ele defende a pessoalidade do Espírito Santo. Para tanto, apresenta argumentos já conhecidos e argumentos novos. Dentre os argumentos já conhecidos e largamente debatidos podemos citar:

1)      O “outro” Consolador (parákletos), citado em João 14, é apresentado como uma pessoa distinta. (enfatiza-se a palavra “outro”)

 2)      Há situações em que ações, sentimentos e características pessoais são atribuídos ao Espírito Santo, indicando tratar-se de um ser pessoal.

3)      A palavra espírito é usada para seres pessoais. Exemplo: Anjos e Deus.

Os novos argumentos em favor da pessoalidade do Espírito Santo são os seguintes:

1)      A sugestão de que uma pessoa não precisa ter corpo para ser considerada uma entidade pessoal.

2)      Uma nova definição de “entidade pessoal”. Definição elaborada de tal forma que o Espírito Santo, por suas características, seja enquadrado com ser pessoal.

Vamos iniciar nossos comentários pelos novos argumentos.

  • Deus Tem Corpo?

Quando perguntado se o Espírito Santo possui corpo, O Dr. José C. Ramos afirma que uma entidade pessoal não precisa ter corpo. Sugere, através de uma pergunta, que Deus, o Pai, mesmo sendo um ser pessoal, não tem corpo: “O corpo não é imprescindível à personalidade. Deus Pai é um ser pessoal. Tem Ele corpo?”, pergunta o Dr. José Carlos Ramos.

Ele pergunta pois não pode afirmar taxativamente que Deus não tem corpo. A Bíblia dá evidências de que Deus tem um corpo. Segundo a Bíblia, o homem foi formado à imagem e semelhança de Deus, o Pai, e do Seu Filho: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança.” - Gên. 1:26. Ellen White entendia que a imagem e semelhança eram física e espiritual: “A Palavra de Deus é perfeita e converte a alma. Se atentarmos diligentemente para os seus preceitos, seremos moldados, física e espiritualmente, à imagem de Deus.” - Carta 103, 1896. (Citado em Mensagens Escolhidas, vol III, pág. 291)

O autor de Hebreus diz que “o Filho é o resplendor da sua glória [de Deus] e a expressa imagem da sua pessoa.” Paulo diz sobre Cristo: “Ele é a imagem do Deus invisível. Col. 1:15. Não podemos confundir o atributo da invisibilidade com a ausência de corpo. Os anjos são seres pessoais, tem corpo e podem se manifestar de forma invisível. Falaremos sobre os anjos a seguir.

A Bíblia apresenta evidências suficientes para acreditarmos que Deus tem um corpo e tem espírito, por isso é também uma pessoa. Como um ser sem corpo poderia assentar-se no trono?  Se não tivesse corpo, como poderíamos afirmar que Jesus está à direita de Deus? Eu creio que um dia poderei ver a Deus.

  • Qual é a definição correta de “entidade pessoal”?

Muito provavelmente a intenção do Dr. José Carlos Ramos, através do argumento de um possível Deus-sem-corpo, é quebrar o conceito que temos de “ser pessoal”. Um dos requisitos de um ser pessoal é ter corpo e também espírito. Ao afirmar que um ser pessoal não precisa ter corpo, o Dr. José Carlos Ramos sente-se no dever de redefinir o conceito “entidade pessoal”. Na segunda resposta da página 6, Ele redefine desta forma: “Uma entidade pessoal é aquela que afeta outras entidades pessoais e é afetada por elas.”

Trata-se de uma definição extremamente abrangente. Praticamente tudo pode ser considerado um ser pessoal através desta definição. Até mesmo um televisor pode ser considerado um ser pessoal, pois afeta os seres humanos e é afetada por eles (quando apertamos o botão do controle remoto, por exemplo). Além disso, esta definição não é precisa do ponto de vista lógico, pois ao longo da definição lança mão do próprio conceito que deseja definir (seres pessoais): Uma falha equivalente a tentar provar uma tese usando como hipótese, durante a demonstração, a própria tese que se deseja provar.

Tenta-se melhorar a definição de “ser pessoal” na pergunta seguinte quando o conceito de “auto-consciência” é introduzido. Isso é um avanço, pois com esta característica adicional o televisor não pode mais ser considerado um ser pessoal. No entanto, mesmo esta “nova definição” não é restritiva o suficiente. Adotando-se esta nova definição, podemos afirmar que o espírito do ser-humano, o meu espírito, por exemplo, é uma entidade pessoal uma vez que afeta, é afetado e tem auto-consciência.

Em suma, a idéia foi redefinir “entidade pessoal” de modo que o Espírito Santo se encaixasse como ser pessoal. No entanto, a definição de ser pessoal do Dr. José C. Ramos ficou muito abrangente e até mesmo o espírito do ser humano (que definitivamente não é uma outra pessoa) pode ser definido como uma entidade pessoal. Numa rápida leitura da entrevista estas falhas conceituais não vêm à tona, mas através de uma leitura um pouco mais atenta estes problemas ficam evidentes.

  • Atributos Pessoais do Espírito Santo

Tenho percebido que a ênfase dos defensores da Trindade tem se deslocado de textos como I João 5:7, Mateus 28:19 e João 14 a 16 para os textos que atribuem ao Espírito Santo ações e qualidades típicas de seres pessoais.

Convém lembrar que isto não serve como prova da pessoalidade do Espírito Santo por duas razões:

   Ao espírito do ser-humano também são atribuídas ações e características pessoais, nem por isso o espírito do homem é uma pessoa distinta do seu possuidor. A Bíblia diz que o espírito de Paulo “orava e cantava” (I Cor. 14:14 e 15). Há outros exemplos. Usando a mesma lógica do Dr. José Carlos Ramos poderíamos perguntar: Quem pode orar e cantar, senão uma pessoa? E chegaríamos à conclusão errada de que o espírito de Paulo era uma pessoa distinta de Paulo.

  • Ao Espírito de Deus também são atribuídas ações passivas típicas de seres impessoais (Exemplo: derramar. Uma pessoa pode ser derramada?) O Dr. José Carlos Ramos chega a contra-argumentar alegando que a Bíblia diz que Deus derramou “do seu Espírito” e não “o seu Espírito”. No entanto não há como negar vários textos onde Deus promete derramar o Seu Espírito: “Derramarei o meu Espírito sobre a tua raça...” (Is. 44:3) “...porque derramarei o meu Espírito sobre a casa de Israel...” (Ez. 39:29) “...derramarei o meu Espírito sobre toda a carne... também sobre os servos e sobre as servas naqueles dias derramarei o meu Espírito.” (Joel 2:28 e 29). Além disso o Espírito Santo aparece sendo “soprado” por Cristo: “Dizendo isto, soprou sobre eles e disse: Recebei o Espírito Santo” (João 20:22). Uma pessoa pode ser soprada sobre outras?

Vimos que a Bíblia dá subsídios para defendermos os dois lados usando esta lógica do “atributos pessoais”. Portanto, uma pessoa prudente e imparcial deveria evitar lançar mão deste tipo de argumento pois sabe que o mesmo argumento defende também a posição contrária.

  • O Outro Consolador

No livro “Eu e o Pai Somos Um”, dediquei um capítulo para analisar esta questão. Uma versão digital do livro pode ser obtida gratuitamente na internet. Por isso, não faz sentido repetir aqui o que já escrevemos lá. Se tiver dificuldade em obter o livro, entre em contato comigo (nicotra@uol.com.br)

  • Anjos são Espíritos e Seres Pessoais... Como Pode?

A citação mais famosa onde os anjos são chamados de espíritos está em Hebreus 1:14. Nesta citação os anjos são chamados de “espíritos (pneuma) ministradores”. De acordo com a definição de Cristo, um espírito não tem corpo visível, tangível (ver Lucas 24:37 e 39), mas sabemos que os anjos têm forma física. Então por que o autor de Hebreus disse que os anjos são espíritos se eles têm corpo visível e tangível? Uma contradição? Será que o autor de Hebreus queria relacionar o ministério dos anjos com o sentido original da palavra pneuma (vento)? Parece incrível, mas é exatamente isto que o contexto diz, que os anjos atuam como ventos (talvez devido à sua velocidade, poder ou invisibilidade). Veja o que diz o contexto, o verso 7 do mesmo capítulo: “Ora, quanto aos anjos, diz: Quem de seus anjos faz ventos, e de seus ministros labaredas de fogo.”

Deus faz de seus anjos ventos (pneuma). Exatamente a mesma palavra usada no verso 7 é também usada no verso 14. O tradutor decidiu traduzir pneuma como “ventos” no verso 7 e pneuma como “espíritos” no verso 14. Uma decisão do tradutor, pois a palavra é a mesma no grego. Ele poderia ter traduzido o v. 14 como “ventos”, então ficaria que os anjos são ventos ministradores. E poderia traduzir o pneuma do verso 7 como “espírito”, assim: “quem de seus anjos faz espíritos?”. De fato, apesar dos anjos possuírem corpo, Deus faz deles ministros invisíveis quando atuam entre nós. Em geral, atuam apenas espiritualmente, não fisicamente, como se não tivessem corpo. Mas isso ocorre porque Deus faz deles espíritos. Há outros versos na Bíblia (obviamente com sentido simbólico) relacionando os anjos à atuação do vento. Apocalipse 7 é um exemplo, onde os 4 anjos seguram os 4 ventos para que houvesse o selamento. Após o selamento os ventos seriam soltos para causar destruição. Esta descrição é simbólica, na realidade não são ventos literais que causarão a destruição pós-selamento, mas são os anjos de Deus (comparados a ventos neste contexto simbólico). Há ainda outras referências, sempre em contexto simbólico, associando anjos a ventos, por exemplo II Samuel 22:11, Salmo 18:10, Salmo 35:5, Salmo 104:4 (não dá para analisar todos aqui). Há também as referências em que Deus promete destruir as nações inimigas com o vento abrasador (Isaías 11:15, por exemplo), mas na prática quem destrói são os anjos (veja o caso dos Assírios e a morte dos primogênitos Egípcios). O que eu desejo destacar é a quantidade de referências que comparam a atuação dos anjos ao pneuma (vento),  por seu poder, velocidade, atuação invisível.

Tal interpretação parece ser mais razoável do que a aplicação da seguinte lógica grega: (1) os anjos são espírito - pneuma (2) os anjos são seres pessoais. Logo, de (1) e (2) concluímos que todos os espíritos (pneumas) são seres pessoais. (Falso). Tal lógica é tão falsa quanto à próxima: (1) Os mamíferos são animais (2) Os mamíferos bebem leite quando pequenos. Logo todos os animais bebem leite quando pequenos. Isso é igualmente falso.

 

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